Eu, o 'centerfold'
Quando me fui deitar, era um pacato pai de família; quando acordei, era a Miss Dezembro
5:55 Quinta-feira, 10 de Dez de 2009
Veja o leitor o que pode acontecer a um cidadão incauto. A revista Playboy manifestou o desejo de me entrevistar. Como todas as pessoas que não têm nada para dizer, gosto muito de ser entrevistado. Por isso, aceitei. E devo ter dado uma entrevista de tal forma sensual que a Playboy resolveu colocar a fotografia do meu rosto apolíneo na capa. Sim, sim: na capa. No sítio em que costuma estar uma senhora nua, estou eu sozinho. Como sempre costuma acontecer, assim que eu entro as senhoras nuas desaparecem. Sou, portanto, a capa da revista Playboy deste mês. Quando me fui deitar, era um pacato pai de família; quando acordei, era a Miss Dezembro. Uma coisa é eu ser um humorista; outra é a minha vida ser ridícula. Deus sabe quanto tenho tentado separar as águas, mas tem sido quase sempre em vão.
Não sei quantos leitores perdeu a Playboy com esta capa, mas posso garantir que perdeu um: eu não compro aquilo, de certeza. Por um lado, é óbvio que as fotografias foram submetidas ao tratamento do photoshop e outras ferramentas de correcção de imagem: o meu nariz tem bastante mais celulite do que parece ali. Por outro, impressiona-me que este seja, até agora, o maior sinal de que o momento que vivemos é mesmo grave. A Playboy, especialista na divulgação de mulheres nuas, publica, este mês, um homem (se isto é um homem) vestido. É bem verdade que a crise não é apenas financeira - é também uma crise de valores. Esta interrupção súbita e sem aviso da exploração do corpo feminino é, evidentemente, imoral. Eu sempre gostei de explorações. E gosto mais ainda do corpo feminino, um gosto que é exacerbado pelo pouco contacto que tenho com ele. Ver-me agora envolvido na suspensão das actividades exploratórias é uma mancha de que a minha biografia não precisava.
A Playboy justifica o despautério com o facto de me ter eleito homem do ano, uma ofensa que 2009, por muito mau que tenha sido, não merecia. Significa isto que, no espaço de um mês, fui distinguido pela ILGA e pela Playboy. O mundo homossexual e o mundo heterossexual deram as mãos e convergiram na necessidade urgente de me agraciar. Que se passa com o mundo? Homossexuais e heterossexuais têm tido, desde sempre, discordâncias, conflitos, tensões. Quando finalmente concordam, dá isto. É bom que os apreciadores da paz e da concórdia façam uma reflexão profunda sobre as ideias que defendem. O que em teoria é bonito, na prática pode ser grotesco.
Resta a curiosidade de saber como vai este número da Playboy trilhar o seu caminho. Que mecânicos irão buscar o martelo e os pregos para pendurarem a minha entrevista na parede das suas oficinas? Que adolescentes se entusiasmarão, no recato dos seus quartos, com as minhas opiniões sobre o sentido da vida? E, a mim, sobra-me o consolo amargo de, finalmente, poder dizer que já tive intimidades com uma capa da Playboy.
2 comentários:
Está muito engraçado...ao seu nível! Este tipo tem mesmo algo de diferente.. tenho muita pena que seja um vermelho doente, mas não há bela em senão... Esforço-me por esquecer as crónicas de autêntico mentecapto que escreve no jornal do "Clube" que mancham horrivelmente estes momentos de brilhantismo...
Confesso que ontem fui meter gasolina. Olhei para a bancada de revistas e as letras garrafais da Playboy, revista colocada na prateleira de destaque tal qual marketing de supermercado, deixou-me surpreendido.
Nunca comprei a revista Playboy portuguesa, mas nao deixo de percorrer com o meu olhar de auditor as diversas capas de revista de uma qualquer gasolineira. Digo isto sem pensar, creio que as revistas femininas de moda estao para as meninas como as beldades de fato de banho estao para os meninos. Creio que todos estamos no mesmo barco, analisar as tendencias da moda. Simples statement, sem espinhas.
Pensamento: "Ricardo na Playboy? Ate na Playboy? Esta tudo doido! ou nao ha cachet, ou as beldades anteriores pediram ao juiz uma providencia cautelar a Administracao por falta de pagamento de servicos fotograficos prestados. Assim se passa de uma Playboy para uma Playgirl."
Deixo aqui dentro, para nao perturbar este texto, um "feliz aniversario" que recebi de um amigo... vale a pena recordar a loucura da MM na America...
http://www.youtube.com/watch?v=k4SLSlSmW74
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